segunda-feira, janeiro 02, 2006

O FUTURO DO SOCIAL NA EUROPA

Há uns dois anos, um artigo da liberal Forbes questionava os franceses sobre como tencionavam trabalhar menos, ter um melhor estado social e viver mais anos no mundo actual. Quem pagava a factura?

Dois anos decorridos, os franceses estão mais pobres e com mais problemas. E com eles, grande parte da europa continental, que não consegue arejar as ideias, libertar-se das amarras do passado, concentrar-se no futuro.

Procuro que os meus alunos percebam que irão viver até aos 150 anos, que não se poderão provavelmente reformar antes dos 120(?); que, ao ritmo do avanço do conhecimento, não se trata já de estudar vida fora, mas de se prepararem para mudar completamente de saberes ao longo da sua vida. Alguns compreendem ao que vou, os outros, a seu tempo, também o compreenderão.

E pergunto-me se os cidadãos europeus compreendem, estão preparados para as grandes mudanças que terão de enfrentar? Mas quem os prepara? O amontoado de dirigentes desorientados, impreparados para o futuro que já se visiona?
Sabemos hoje que a mudança pode ser gerida, que existem metodologias para diminuir as resistências à mesma, que se requer preparação adequada. Mas as classes dirigentes insistem em o ignorar, agarradas que estão a ideias passadas e aos interesses instalados, por isso mesmo, interesses do passado.

Uma questão fundamental é a de como se devem os estados europeus organizar para compatibilizarem a necessidade crescente de individualismo, de criatividade, para dar resposta ao futuro, com a necessidade de perseverar a solidariedade social tão cara, e bem, a este continente.

No que concerne à previdência social, os estudos mais diversos, embora nem sempre unânimes, parecem indicar que o sistema actual não é viável do ponto de vista financeiro. E quando olho para a crescente desumanização inerente a este sistema, onde se passa ao largo do pobre que dorme na soleira, dos velhos sós, dos com fome, envergonhados ou não, constato que os males não são só os financeiros. O modelo não só está esgotado, como não prova.

As famílias já não são pilar social, como o eram no passado, capaz de assegurar o apoio aos seus mais carenciados, às suas crianças, aos seus velhos, aos seus doentes. Mas os estados e os seus sistemas continuam a fundar-se na velha noção da família/clã, exigindo-lhe uma resposta que ela já não pode dar. Ora o mudar esta perspectiva pode ajudar ao encontrar de soluções para a crise do social.

Talvez os europeus pudessem aproveitar a oportunidade para criar uma nova célula social base onde assentar a construção da sociedade. Célula local que providenciasse serviços mais humanizados e de maior proximidade aos seus carenciados, crianças, velhos, desempregados, doentes. Célula a funcionar sempre numa lógica de abertura ao todo social em que se inserem[1], condição necessária à sua evolução e ao acrescer da sua inteligência.

O ressurgimento do conceito da comunidade local? Talvez. Mas, sobretudo, o encontrar novas formas de organização social capazes de aproveitar as enormes energias solidárias disponíveis nas nossas sociedades para resolver as grandes questões sociais, mobilizando os europeus no revolucionar do seu modo de estar, no revolucionar das suas mentalidades.

[1] Ou seja, ter-se-ia de garantir a fácil possibilidade de os cidadãos que as integram, migrarem de uma para outra, e teriam de constantemente se adaptar ao todo social e para ele contribuírem. [Sabemos hoje que os sistemas fechados sobre si próprios não evoluem, transformam-se em abcessos sociais que, tarde ou cedo, prejudicam a harmonia social].