sábado, fevereiro 09, 2008

UMA MULHER

Não me via o anseio de ir? Não me via o mudar o peso de perna, a impaciência da timidez? Ou via e queria afastá-la?

Disse-me que aos nove anos servia a dias para ajudar a mãe, e que teve sonhos, e que os perseguiu a pulso. Disse-me que teve, que deixou de ter e que novamente se tinha erguido a pulso. E disse. E disse. Tecera a sabedoria com a sensibilidade, com a experiência, com o intelecto. E queria, inexplicavelmente, dizer-se em quinze minutos. De enfiada. Uma alma linda, feita com a quarta classe e os sonhos e os filhos e os afectos e a vontade, numa ânsia de partilha.

Oscilei entre o que ouvia e o temor de ser o que queria ouvir. As duas coisas escorregando numa timidez que se me erguia, a do medo de não poder ou de não saber retribuir.

Entrou uma freguesa e ela foi-se a aviá-la. Calçada acima, não percebi se estava ou não a fugir de um encantamento.