segunda-feira, janeiro 30, 2006

Entendi que seria interessante colocar aqui um texto que fui elaborando sobre a cultura portuguesa e o seu impacto no devir português. A extensão do texto leva a que eu o vá colocando, em partes, ao sabor da vida deste blog.

A CULTURA NACIONAL, CAUSA PRIMEIRA (1)

Surpreendo-me amiudadas vezes em deparar com gente com responsabilidades e uma tremenda ignorância sobre o impacto social da cultura. “Nunca tinha pensado nisso!”, “Realmente…”, são confissões que vou escutando. E a questão é que a causa primeira da actual crise portuguesa é a cultura nacional, a forma de ser dos portugueses, a forma de fazerem as coisas, sempre ignorada por eles, pelas suas elites, pelas suas classes dirigentes. E também o é de uma boa parte da europa, da velha europa, termo que, conforme resulta do que adiante digo, me parece correctíssimo.

Aqueles que pretendam fazer política séria, com rigor, têm a obrigação de compreender como a cultura condiciona o debate e a resolução das questões sociais, políticas e económicas, têm a obrigação de compreender como a cultura se faz e têm a obrigação de compreender como a cultura se muda e de que hoje há conhecimento sobre o acelerar dessa mudança.
Urge mentalizar elites e urge renovar elites, elites que o saibam e o usem no garantir de um futuro para a nação.


1. O que é a cultura

Comecemos antes do mais em situar o que se entende por cultura. A cultura de uma sociedade manifesta-se nas atitudes e nos comportamentos dos seus membros. Daí que os americanos digam, de uma forma simplista, que a cultura é “a forma como fazemos as coisas por aqui”.
Os comportamentos e atitudes resultam das crenças e valores − aquilo em que os membros da dita sociedade acreditam e aquilo a que, embora eventualmente não pratiquem, atribuem importância −. Em muitas sociedades tradicionais, por exemplo, havia a crença de que a velhice significava sabedoria e, nessa medida, os velhos eram particularmente respeitados, através de atitudes e comportamentos ajustados dos demais membros dessas sociedades. Valores e crenças vão-se alterando, embora mais lentamente que as atitudes e comportamentos. Mas existe cada vez mais conhecimento sobre como o fazer.
Por sua vez, valores e crenças assentam em algo mais profundo, as ditas assunções básicas, um conjunto de premissas fundamentais, mais profundamente entranhadas em mecanismos do inconsciente e, por isso mesmo, mais dificilmente modificáveis. Há quem sustente que tal só é possível com a ocorrência de acontecimentos traumatizantes, através de profundo sofrer.
(continua)