sexta-feira, fevereiro 03, 2006

A CULTURA NACIONAL, CAUSA PRIMEIRA (5)

4. Como mudar aquelas componentes indesejáveis

A grande questão é de como se há-de promover tais mudanças culturais. Como disse, existe hoje bastante conhecimento sobre técnicas e metodologias para alavancar mudanças culturais. Tais métodos visam refazer as redes neuronais que levam cada um ao seu entendimento do mundo e das coisas, levando-o a adoptar outras formas de o fazer. Quando se trata de sociedades, os meios de comunicação social podem desempenhar um papel relevante no pôr em causa as velhas certezas e no forjar das novas realidades.

Mas profundas alterações no modo como a sociedade portuguesa desenvolve as suas actividades económicas e sociais é, para mim, a chave da questão, o que é realmente necessário para assegurar que as novas realidades se entranhem. Daí que entenda ser fundamental a adopção de dois conjuntos de medidas, em simultâneo.

Um primeiro relacionado com as classes dirigentes, porque a liderança é nesta questão um ponto fundamental, como bem o sabe o povo. Os líderes, como disse, emitem sinais que condicionam o comportamento dos seguidores. Ora uma boa fatia das nossas classes dirigentes, e não só políticas, ou até públicas, mas também privadas, como associações patronais e sindicais, é pouco capaz ou serve-se em lugar de servir. Grande parte é gente pequena, empoleirada em alturas em que se têm de proteger das vertigens.
Haveria que criar condições para que os bons que nelas restam, procurem arrebanhar aqueles que ainda se possam corrigir; que criar condições para que se promovam organizações cívicas, para além dos partidos, afim de gerar novas elites. E haveria que as preparar para contribuírem para a necessária mudança cultural.
Não é tarefa fácil dado o estado de deterioração atingido, pelos muitos telhados de vidro que inibem muitos. Sem resolver este particular aspecto, será difícil uma ampla mobilização. Mas muita coisa se pode e tem de fazer, até apara o apoio ao segundo conjunto de medidas que proponho.

E este segundo conjunto de medidas é a receita liberal: o reduzir drasticamente o aparelho do estado, o aumentar a sua credibilidade e o seu desempenho; o entregar muitas das actuais funções do estado a organizações da sociedade civil; o fomentar um mercado mais livre e concorrencial, em que não se temam as boas gestões estrangeiras − que a independência de uma nação é a das almas dos seus cidadãos e não o do controlo de pseudo centros de decisão económica −.
Seria um crescimento doloroso, estou certo, mas ajudaria a mudar a postura da mulher e do homem português para atitudes mais consentâneas com a sua sobrevivência futura.

Pautando-me, em teoria, por outros catecismos, reconheço ser este o remédio apropriado para o momento nacional.
A ser assim, seria bom que a esquerda abandonasse ideias e vestes do passado, que procurasse vias para evitar ou minorar os reconhecidos efeitos secundários do remédio, e que cuidasse de lhe encontrar alternativas credíveis para o futuro. Pessoalmente, penso que devia pugnar para que os actuais serviços estatais de educação, saúde, de solidariedade fossem sendo progressivamente apropriados por organizações locais radicadas nos seus principais utentes. Penso que deveria pugnar para que se criassem organizações cívicas de cidadania com real poder de intervenção a nível local. Fundamentalmente, contribuir para a criação de um espírito cívico, de solidariedade e de independência no cidadão português.
Seria bom todos acordarmos para o impacto que a cultura tem no nosso futuro. Ignorá-la é escolher a via mais difícil e, portanto, custosa de fazer mudanças. Mas é, sobretudo, aumentar o risco de cometer erros graves na tomada de decisão política. Como no exemplo do prolongar no tempo do imposto da SISA, que acima se viu.