terça-feira, agosto 30, 2005

JOÃO CRAVINHO E O BETÃO/ASFALTO

O Público cita os seguintes dizeres de João Cravinho, no Diário de Notícias de ontem:

- "Quando discutimos a Ota e o TGV, é preciso ter consciência de que estamos hoje a decidir muito do que Portugal poderá ser ou não lá por volta de 2030 ou 2040." e

- "Se continuarmos sujeitos à miopia e à ausência de sentido estratégico que hoje estão em moda na comunicação social, Portugal não terá infra-estruturas de alta qualidade nem massa crítica metropolitana capaz de evitar a sua transformação num apêndice das bases logísticas de Espanha."

João Cravinho parece assim supor que a maioria dos que contestam as referidas obras, não têm visão estratégica. Mas, em termos de rigor estratégico, as bases logísticas portuguesas deviam ser pensadas em função da sua utilidade, ou seja, do que queremos ser e fazer como país; e, só então, deveriam ser construídas, numa óptica de complementaridade com Espanha, a Europa e o Mundo.

A maioria dos políticos argumentará que algumas obras servirão qualquer vocação e, que por isso, não devem ser atrasadas. É nesta linha que vai Sócrates quando, sobre o TGV, afirma que não podemos ficar fora das redes europeias. Tendo a considerar este argumento razoável no que respeita ao TGV, e defendo mesmo que o seu traçado deveria ser mais ambicioso. Assim, embora não me pareça crucial o TGV Porto/Lisboa, já o Porto/Madrid e o Lisboa/Madrid me parecem importantes, desde que abarquem também o transporte de mercadorias. Isto porque creio que as forças que condicionam a evolução dos transportes continentais, a longo prazo, privilegiarão o comboio em relação aos transportes aéreos e por estrada. Outro tanto não me parece defensável em termos do projecto da OTA.

Mas a questão fundamental que me traz é a da estratégia, proposta e não tratada por João Cravinho. Mesmo considerando que o lançamento de grandes obras é um meio de fomentar o crescimento e o emprego a curto e médio prazo, que é o mais fácil e o que melhor satisfaz os interesses instalados, em termos estratégicos trata-se de um "crescimento" não sustentável, porque visa infra-estruturas e não o desenvolvimento continuado de valor resultante de uma vocação.

Para visar este último os Políticos terão de ter o arrojo de propor vocações para o país e de as fazer acontecer. Terão de ter a coragem de enfrentar mentalidades instaladas e interesses instalados, que foram sendo forjados num modelo de desenvolvimento que já foi, não é mais, como muito se tem repetido. Se bem o fizerem, os portugueses sacrificar-se-ão alegremente na construção do seu futuro. E esses Políticos farão História.

Esta é a questão chave do país neste momento e não os fogos, nem Sr. Mário Soares, nem o Sr. Cavaco Silva.

Sem comentários: