segunda-feira, maio 12, 2008

O RESSURGIMENTO DA ÉTICA

Dizem-me que nos EUA jovens candidatos a emprego salvaguardam desde logo que às 18.00 horas têm de sair para ir à aula de yoga e similares. Dizem-me que em Inglaterra uma vaga de gestores prefere abdicar de privilégios e prefere auferir vencimentos mais reduzidos em favor de mais tempo para poder ter uma melhor qualidade de vida.

Pressinto nestes epifenómenos que algo de mais profundo se avizinha: uma nova forma de encarar a vida nas sociedades ocidentais. Aceita-se ainda que se façam contratos de montantes absurdos com jogadores de futebol, mas já se revela indignação. As recentes ciclópicas indemnizações a ex-administradores do BCP foram consideradas, de forma geral, como que um roubo aos clientes e aos accionistas. Os salários demasiado elevados dos gestores são questionados pelo Presidente da República. Um prémio Nobel da economia vem-nos demonstrar a irracionalidade económica dos prémios que muitos gestores se auto-atribuem. E as pessoas recordam mais o contraste com os humilhados e os excluídos de todo o globo.

Alguns factores são fundamentais no ressurgimento de uma nova forma de estar nas sociedades ocidentais.

O aprofundamento da comunicação de pessoas, de bens e de informação, a nível global, faz com que tudo se passe à nossa porta. E ou nos condoemos da dor em que vivem muitos milhões de vizinhos, ou tememos a sua provável reacção. E sentimos que temos de arrepiar caminho.

Mas a comunicação acarreta algo de socialmente mais importante: a possibilidade de evolução para formas mais complexas de organização das sociedades. Tende-se para que cada cidadão seja um nó inteligente de uma vasta rede social que cobre a biosfera. É a concretização da noosfera, proposta por T. Chardin. Cada um tem acesso facilitado a formação e informação/enformação. O poder de decisão sobre o futuro de acontecimentos sociais estar-lhe-á cada vez mais próximo. A possibilidade de controlo sobre os acontecimentos e sobre os seus actores também. Mas quem detem o poder instituído tudo fará para retardar o processo. E sentimos que temos de arrepiar caminho.

A degradação do meio ambiente começa a ser sentida como muito grave, afectando já as nossas vidas e não unicamente, passe o cinismo, as dos nossos filhos. E sentimos que temos de arrepiar caminho.

A escassez de recursos que começou a sentir-se há alguns anos nalgumas matérias-primas, ganhou protagonismo com a ascensão do petróleo e parece começar a alastrar a alguns bens alimentares. A falta de água já é uma realidade em demasiados pontos dos nossos países. E sentimos que temos de arrepiar caminho.

O novo-riquismo das novas classes médias, que fomentou em boa parte o consumismo, talvez esteja em declínio face aos novos apelos do conhecimento e do entretenimento. E é-lhe assim mais fácil arrepiar caminho.

O impacto destes factores no nosso viver já há muitos anos tinha sido anunciado. Mas só agora parece começar realmente a fazer-se sentir. E ele implica a assunção de novos valores. Está a ressurgir a ética, com roupagens obviamente adequadas ao futuro que pressentimos ter de salvaguardar.

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