sexta-feira, novembro 04, 2005

SOBRINHO SIMÕES E JUDITE SOUSA


Não fora Sobrinho Simões um português emérito, com excelente obra feita e uma simpatia transbordante, e não fora Judite de Sousa justamente tida como uma boa entrevistadora, não estaria eu aqui a “desancá-los”. É que uma mensagem incorrecta passada por tal gente tem obviamente efeitos mais perniciosos que se fossem outros de menor estatura a dizê-lo.

Ontem, na RTP1, pela segunda vez, (ou)vi uma conversa entre ambos. Uma Judite de Sousa embevecida, deslumbrada, irreconhecível. Um Sobrinho Simões na senda do aprofundar a necessidade de pensamento positivo, mas ontem, porque indevidamente utilizado, um pensamento positivo postiço. No seu discurso, todos eram excelentes, todos eram os maiores, tudo é uma maravilha, as gentes portuguesas é que se subvalorizam. Não foi certamente a intenção, mas foi a mensagem que passou.

Este discurso das gentes que se menosprezam, iniciado e oficializado por Jorge Sampaio, foge ao rigor e prejudica a construção de um futuro para Portugal. A construção do futuro, quer seja o de uma empresa, quer seja o pessoal, quer seja o de um país, tem de assentar em bases sólidas, ou seja naquilo que se sabe fazer tão bem ou melhor que os outros; se as competências encontradas não bastarem para o fazer, há que trabalhar para adquirir as que falham. Daí a necessidade de se proceder da comparação com os outros, com o maior dos rigores, repito, com o maior dos rigores, não se vá construir o castelo sobre areia.

É inadequado o discurso de considerar a reduzida auto estima do povo português como o escolho. A auto estima é o estimar daquilo em que se é melhor e daquilo em que se é pior que os outros. Confundi-la com sentimentos é um erro grave: pode levar à tentação de accionar mecanismos de compensação perante fraquezas detectadas, ocultando-as, ilusoriamente transformando a areia em betão, para de seguida aí se construir o castelo.

Outra coisa é esse sentimento de derrota antecipada perante numerosas fraquezas, sensação de impotência para enfrentar o futuro. E num povo, cujo homem nunca se assumiu, “nunca cortou o cordão umbilical”, como dizia Sena, e que por isso entrega em demasia o seu futuro às classes dirigentes, aquela sensação de impotência amplia-se e mais o paralisa.

Admitindo ser esta a situação portuguesa a remediar, ela deve ser combatida utilizando com firmeza e rigor a auto estima, na acepção acima defendida, como ponto de partida. Ou seja, deve-se clara e rigorosamente determinar e propagandear as fraquezas e forças portuguesas que importam para construir o futuro, o que é necessário fazer para realmente transformar a areia em betão e como deve cada português contribuir. O alento deve ser procurado na direcção, na orientação para o que se deve construir.

Outra concepção de auto estima pode ser aparentemente politicamente correcta em termos da cultura actual portuguesa, mas só contribui para o postiço e para uma agonia não desejada.

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