segunda-feira, março 13, 2006

CAVACO E SÓCRATES

Como já vários disseram, quando houve a relativa certeza de que Cavaco se iria candidatar à Presidência da República, Sócrates terá decidido que lhe conviria governar com ele: terá acreditado sobretudo que assim se criariam condições para levar o seu partido a subscrever medidas necessárias, mas a que o respectivo aparelho se opõe; terá acreditado também que, de certa forma, assim reduziria o que poderia vir a ser o peso do principal partido da oposição, perante as ainda dolorosas medidas de que o país necessita. E, nesta visão, terá conduzido toda a acção do PS nas eleições presidenciais. A ser assim, parece que teríamos de tirar o chapéu à sua mestria política.

E, contudo, as coisas podem não ser tão lineares. Duas coisas movem os homens: as suas acções e o acaso; às vezes mais umas, outras vezes mais o outro. Mas as acções resultam, em grande medida, do profundamente enraizado no espírito de cada um e que dele faz um ser único. E isso constata-se pelas atitudes e comportamentos de cada um; pressente-se nas crenças e nos valores que lhe percebemos.

Nesta perspectiva, vejo um Cavaco que acredita no valor da honestidade e crê nela se enquadrar; cujas decisões são feitas no rigor; que não acredita no acaso e que, talvez por isso, não se alonga no futuro para além de uma meia dúzia de anos.

Também vejo um Sócrates com uma maior crença na sorte, e, também por isso, usando um menor rigor na decisão e tendo uma maior propensão para sonhar o futuro, ou seja, a estender o seu horizonte muito para além da meia dúzia de anos.

Se Sócrates levasse Cavaco a esquecer alguns dos seus bisonhos assessores, a acreditar um pouco mais na sorte e a ver para além da mera meia dúzia de anos; e se Cavaco convencesse Sócrates da imprescindibilidade do rigor na metodologia do pensar e na importância de um povo perceber a honestidade nos seus governantes e instituições, auguraria para Portugal uma próxima década feliz.

Infelizmente, e como acima disse, há coisas que estão profundamente enraizadas em cada homem. E, como assim deverá ser também neste caso, talvez os portugueses venham a ser surpreendidos com conflitos mais ou menos insanáveis entre os dois, com as correspondentes menores eficácia e eficiência de que o país tanto necessita.

Oxalá me engane e, de preferência, redondamente!