sábado, outubro 29, 2005

SUBIDA

Sobe-se à montanha
Respira-se largueza
Abarca-se o tempo ao longe.
Para subir mais
Alijam-se as miudezas.
E o que chega ao cimo
Respira o infinito e nele dissolve o tempo.

segunda-feira, outubro 24, 2005

CANÇÕES

Amanhecem canções
Que ecoam nas noites
Amanhecem canções
Que a noite faz esquecer
Amanhecem canções sem ocaso.

E há sempre gente a amanhecer canções.

C. Marques Pinto

sexta-feira, outubro 21, 2005


















Junto aos Clérigos
Maria Cerveira
SISA E FIM DE MANDATO PRESIDENCIAL


Senhor Presidente da República



Excelência:


Sou a sugerir-lhe uma atitude de reparo a milhões de portugueses, neste fim do seu mandato. Reparo que não encontra raiz no proceder de V. Ex.ª, antes ancora no pré 25 de Abril e em muitos dos seus seguidores.

Refiro-me à mancha que impende sobre aqueles que se furtaram ao pagamento da defunta SISA. Tratava-se de um imposto que o tempo e as práticas fiscais tornaram cada vez mais injusto. O opróbrio recai sobre muitos que então prevaricaram, sob pena de não comprarem a habitação almejada.

O grande lucro com o estado de coisas não era tanto desses portugueses quanto o dos construtores, por via da fuga ao IRC. A grande perda foi a do país que, pela inépcia de sucessivos responsáveis, permitiu que assim se prolongasse no tempo a elevada improdutividade de um dos seus maiores sectores de actividade, só possível pelas margens de lucro especulativas associadas. Estado de coisas que transbordou para a cultura nacional, contribuindo para grande parte das deficiências que lhe reconhecemos.

Recordo o que de lamentável se passou, a propósito, com o Dr. António Vitorino e interrogo-me sobre se tal estigma o continuou a afastar de contribuir para outras responsabilidades nacionais.

De alguma forma poderá V. Ex.ª contribuir certamente para como que amnistiar estes milhões de portugueses, o que constituiria um acto de justiça e de boa lembrança das suas presidências.

Bem haja.

sexta-feira, outubro 14, 2005

COMENTADORES E RESULTADOS DAS AUTÁRQUICAS

Pacheco Pereira sustenta que os resultados menos bons do PS se deveram menos às medidas de austeridade socratianas do que aos desmandos de má gestão de Sócrates: insistência no projecto da OTA - onde é voz corrente que altos dignatários do PS e PSD têm vindo a comprar terrenos a bom ritmo -, nomação de Fernando Gomes para a Galp, substituição da boa gestão que se fazia na CGD incluindo Armando Vara na nova equipa, insistir em férias com o país a arder, etc.).

Miguel Sousa Tavares parece atribuir os resultados menos bons a uma deficiente gestão estratégica e táctica por parte dos respectivos responsáveis do PS.

Vasco Pulido Valente sustenta que a grande razão é o "apertar do cinto", à semelhança do que se passa na França e na Alemanha.

Como sempre, terão todos um pouco de razão. Contudo, parece-me interessante recorrer ao conhecimento comprovado na área da gestão, como contributo para que o leitor possa analisar por si cada uma destas posições.

Em gestão é habitual considerar que existem dois tipos de mudanças. Umas, referidas por mudanças transaccionais, referem-se às mudanças do dia a dia, inerentes à gestão corrente, onde não ocorrem grandes sobressaltos. Para lidar com estas, bastam os líderes nomeados para o efeito, que tenham algum poder de premiar e de punir e, eventualmente, informação privilegiada.

Mas quando há que encetar reformas profundas, que são ditas transformacionais, é requerido o empenho dos subordinados, sem o que elas dificilmente vão avante. Ora os estudos comprovam que tal empenho decorre da existência de líderes com poder carismático e/ou poder resultante de uma comprovada experiência anterior.

Por outro lado, os estudos evidenciam que os actos dos líderes têm mais impacto que o que eles dizem. Assim, se o patrão faz um grande discurso sobre a necessidade de os seus colaboradores se preocuparem com o futuro da empresa - ao nível da modernização, do lançamento de novos produtos, etc. - mas se, no dia a dia estes constatam que ele passa 90% do tempo a ver o que se pode cobrar, como se há-de pagar isto e aquilo e por aí fora, aquilo a que os colaboradores vão dar importância é à facturação, aos custos e à cobrança, esquecendo o futuro; ou seja, não lhes interessa o que ele disse, mas sim ao que ele faz.

Posto isto coloco uma questão. O que tem mais impacto sobre povo português: o que o Sr. Sócrates e outros dirigentes dizem sobre a necessidade da austeridade, ou a adopção sistemática de atitudes e actos de má gestão? Disto tudo conclua o leitor o que bem entender.
O HOMEM QUE NÃO SOBE À MONTANHA É UM HOMEM PEQUENO

Falava com um candidato de uma lista das recentes eleições autárquicas sobre os seus resultados. A conversa com aquele aquele jovem honesto, inteligente e trabalhador enrodilhou-se nas miudezas do costume, apartando-se do rumo. Que ganhou por 30 votos, que a cara do candidato é que contou, etc, etc.

No meu respeito pelo interlocutor lembrei-lhe a necessidade de se desligar, de se altear, de ver o conjunto e de ver mais além. Em suma, de subir à montanha. Lá do alto, os homens cá em baixo são pequeninos e os seus problemas miudos.

A questão não é só a da árvore que distrai da floresta. É também a do espaço que se alcança e se respira e a do tempo que escorre lentamente ou não escorre de todo. Então, é mais fácil ver e estar com a luz.

E Moisés foi buscar as Tábuas da Lei à montanha.

quarta-feira, outubro 12, 2005

À ATENÇÃO DE RUI RIO: “PORTO COSMPOLITA”

De há uns anos a esta parte tenho vindo a defender o turismo residencial como um dos grandes objectivos estratégicos do país, dadas as vantagens competitivas e sustentáveis existentes. Outros grandes objectivos existem, como seja a exploração adequada dos recursos marítimos e dos recursos florestais, ambos tão mal tratados pela curteza de vistas, mesquinhez e incompetência das classes dirigentes (note-se que esta engloba não são só políticos, mas também representantes do patronato e dos trabalhadores, também eles eternizados e/ou entronizados, grande parte das vezes, nas suas torres de marfim, etc.); mas com eles já muitos despendem o seu tempo.

Já algures apresentei as razões da grande mais valia para o país em massificar o turismo residencial para cidadãos seniores de países europeus. Fui criticado por pretender que se transformasse o país numa nova Florida; fê-lo, indirectamente, um ex-secretário de estado do turismo, possivelmente enleado nas teias de interesses dos lobbies turísticos existentes. Finalmente, nas últimas legislativas, um jornalista do Expresso coloca directamente a questão a António Borges, que se pronuncia a favor deste tipo de turismo. Insisti na ideia em intervenções no blog que entretanto criei − http://aalmanaoepequena.blogspot.com/ − e junto dos gabinetes de Manuel Pinho e de José Sócrates. Vem agora a lume a notícia de que o responsável pelo conselho das cem maiores empresas latinas considera o lançamento do turismo como uma das activdades fulcrais para o desenvolvimento do país.

Constou-me entretanto que o Governo se prepararia para mandar fazer um estudo sobre o tema, que poria a concurso internacional. A ideia seria saber quanto se obteria por cada euro investido no turismo residencial. Ora tal estudo não se justifica, já que qualquer cidadão minimamente habilitado, depois de lhe explicarem do que se trata, com uma meia dúzia de contas constata que se trata de uma actividade altamente rentável. Qual então o objectivo do estudo? Convencer-nos que mais vale gastar dinheiro na OTA? Deixo as especulações a quem me lê.

Introduzida a questão, sou agora a avançar um pouco numa possível forma da sua concretização para lá do Governo, no receio de que com este nada se fará tão cedo. Na realidade trata-se de um projecto, como já referi algures, que pode mobilizar todo o país. Assim sendo, porque não pegarem nele as autarquias?

Ora acontece que a cidade do Porto tem condições ímpares para tirar partido do turismo residencial sénior; sobre o assunto ocorreram-me duas ou três ideias que poderiam simultaneamente enriquecer o Porto e projectá-lo como capital do Norte da Península. Aqui as deixo.

A zona ribeirinha, que se estende desde as Fontaínhas, cerca S. Bento e vai até Massarelos tem de ser reconstruída, o que custará milhares de milhões de euros e levanta dificuldades como seja a do seu repovoamento. Então, porque não expropriar toda essa zona, respeitando os interesses de todos os envolvidos, para seguidamente a dividir em grandes bairros e negociar a reconstrução e exploração de cada um junto de imobiliárias de países escolhidos?

Concretizando: o bairro X seria negociado com uma mobiliária alemã que o reconstruiria no respeito pela sua traça e por outras nossas normas, mas de forma a adequá-lo ao que um casal sénior alemão da classe média espera encontrar no seu lar. Criaria também zonas comuns destinadas a lazer e encontro desses cidadãos, mas abertos ao público em geral. Uma vez feita a reconstrução, a comercialização do seu usufruto e a exploração das diversas zonas comuns ficariam a cargo dessa imobiliária; o seu mercado alvo seria o dos cidadãos seniores alemães. O bairro Y seria negociado com uma empresa imobiliária inglesa em condições similares; o Z a uma escandinava, etc, visando os países frios da Europa com um nível de vida compatível.
Refiro a venda do usufruto, e não da raiz do bem, como meio de embaratecer o custo da habitação, o que permite alargar o mercado alvo, obviamente. E tem também outras vantagens.

O que aconteceria? Em meia dúzia de anos o Porto ficaria com um bairro alemão, um bairro inglês, um bairro escandinavo, etc, cada um com os seus costumes, com as suas formas de lazer. Tal procedimento potenciaria em muito a comercialização das habitações, já que se ofereceria, para além do clima ameno, da proximidade ao país de origem, da localização privilegiada relativamente ao Douro, da nossa gastronomia − ainda que tão mal tratada nos tempos que correm −, etc., já que se ofereceria, dizia, a possibilidade de um inglês ir a uma cervejaria alemã e um alemão ir a um pub inglês (, e nós a ambos…). Tal projecto potenciaria também o turismo não residencial, não só o dos filhos e familiares desses seniores, mas também o dos nossos vizinhos espanhóis atraídos certamente por esse cosmopolitismo.

Muito mais poderia dizer sobre as vantagens de levar avante tal projecto. Não desconheço algumas dificuldades na sua concretização, mas não as enumero, porque entendo dever deixar tal tarefa aos numerosos especialistas em encontrar dificuldades e defeitos que, infelizmente, por aí pululam

terça-feira, outubro 04, 2005

FELGUEIRAS & C.ª E OS COMENTADORES POLÍTICOS

Fui assistindo, no Público, semana após semana, à desilusão que o povo criava em Miguel Sousa Tavares. Não pediu para que se substituísse o povo, mas pouco faltou. A grande maioria dos comentadores acompanhou-o.

Não me perplexifiquei! Antes me pergunto como é possível culpar o povo de votar em pessoas de que gosta e lhe estão próximas, apesar das suspeitas de que não são gente séria, se esse povo foi preparado ao longo dos anos para o fazer? Poderia escrever um livro sobre o laborioso trabalho das elites governantes no pós 25 de Abril feito nesse sentido. E também há, para além de tal esforço, outras razões. Como prefiro ser preguiçoso, dou só uma dica relativamente a cada uma destas vertentes.

Há evidência científica (quem não sabe o que isto é, que se informe!) de os actos dos chefes - das elites, no caso vertente - terem um forte valor simbólico para os subordinados - o povo, no caso vertente -. Assim, o seu comportamento dá as orientações sobre o que estes devem fazer. Em caso de tais actos contrariarem o respectivo discurso verbal, verifica-se que é a mensagem implícita nos actos que tende a prevalecer sobre o discurso. Por exemplo, quando Sócrates nomeia Armando Vara para a CGD, dá sinal de que continuará a não existir o rigor necessário na gestão da coisa pública - coisa que já sabíamos pela insistência sobre a construção do aeroporto da OTA e outros, aliás -, por mais que verbalize que o Governo é em tudo rigoroso.

Mas há também as questões que decorrem do edifício legal em sociedades em mudança acelerada. É que nestas sociedades, em que surgem constantemente situações não previstas, é difícil manter actualizado um edifício legal, com as consequências daí decorrentes. Se juntarmos a este facto o edifício legal existente no 25 de Abril, as políticas de inverdade desde então praticadas pelas elites e a impreparação (e também, muitas vezes, a malandrice) de quem faz as leis, o quadro agrava-se. Um exemplo: o ter-se mantido a SISA em 10% mais de vinte anos após o 25 de Abril, servindo objectivamente os interesses dos lobbies da construção civil (fuga ao IRC), tornou mais de 90% (só?) dos portugueses em infractores fiscais.
TURISMO RESIDENCIAL PARA SENIORES

Entre as dez medidas propostas pelo conselho das cem maiores empresas latinas ao nosso Governo, para nos tirar do "buraco", figura o turismo residencial para seniores. Interrogo-me há anos (!) porque não percebem os nossos governantes isto. Não revelo as respostas pouco abonatórias que me ocorrem. Contudo, suspeito que os lobbies turísticos do que entendo ser já passado, não serão alheios (também!).

Entretanto, penso que o futuro presidente da Câmara do Porto (Rui Rio?), deveria, para reconstruir o centro do Porto, expropriar quarteirões inteiros de toda aquela zona que se estende da Batalha ao Palácio, e entregar um "naco" a uma imobiliária alemã, para, respeitando a traça, criar um bairro alemão; outro "naco" iria para uma imobiliária inglesa; outro para uma espanhola; etc. Tudo para seniores e seus negócios. Seria muito giro para quem cá vive, e para eles, poder, em poucos minutos, mudar de “ambiente”, não? E fomentava o turismo não residencial, obviamente…